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Ferramenta para sobreviver à crise
Fonte: Jornal do Comércio
Luciane Medeiros
A crise econômica que atingiu os mercados nos últimos meses instaurou um quadro de incertezas no mundo dos negócios para o próximo ano. Grandes instituições financeiras e empresas faliram ou registraram perdas em seus balanços, criando projeções de novas turbulências. A probabilidade de redução da rentabilidade das empresas, do crédito e do consumo em 2009 tornam o planejamento tributário uma ferramenta de auxílio para que os gestores possam evitar prejuízos e programar suas ações.
Conforme o tributarista da Veirano Advogados André Gomes, nos últimos cinco anos, com a explosão econômica, muitas empresas focaram nas vendas e expansão, deixando de planejar suas operações do ponto de vista dos controles internos. No momento em que vivenciam o crescimento e obtêm ganhos, a preocupação com o pagamento de impostos não se sobressai tanto. "Agora, em meio às perdas, os empresários sentem falta de ter organizado melhor suas contas e de pagar menos."
O planejamento tributário divide-se em dois conceitos. Para alguns, envolve preparação antecipada de atividades como investimentos e contenções, por exemplo. Já para outros, infelizmente, o significado do termo ainda está restrito a "apagar incêndios". "O empresário busca orientação quando o problema já existe e quer que seja feita uma mágica", critica o sócio da DRS Auditores Roberto José Fidryszewski.
Ele explica que planejamento tributário não significa fazer evasão ou elisão fiscal, mas sim usar mecanismos que dêem segurança para a empresa pagar corretamente os tributos. "Ainda são poucos os empresários que se organizam e procuram ter uma visão de longo e médio prazo de como será desenvolvido seu trabalho, se está gerando negócios ou impostos", diz.
Esse posicionamento em relação ao tema de que seria algo ilícito ainda é comum. O que ocorre na realidade com o planejamento tributário é que se trata de compreender como as operações de determinado grupo podem ser desenvolvidas de forma a otimizar da melhor maneira os negócios. O planejamento é o "olhar dentro da operação" e ver como estruturará o pagamento de impostos e outras ações de acordo com a legislação vigente, agindo da forma correta, explica Gomes.
O ideal é que nessa época do ano a empresa já tenha elaborado um esboço das metas para 2009, estipulando o que pretende fazer, qual seu ponto fraco, o que pode atingir seus negócios. Devem ser verificados os dados projetados para o próximo período, tais como o faturamento e os custos e despesas, de modo a definir a forma mais econômica de tributação.
Opção por lucro atende a requisitos da legislação
O planejamento tributário dá condições de escolher o regime mais adequado à situação da sua empresa. É preciso avaliar as apurações do Imposto de Renda e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) pelo Lucro Presumido ou Real. A legislação estabelece requisitos para que a empresa possa fazer a opção pelo Lucro Real anual, Lucro Real trimestral ou Lucro Presumido.
Entre outras situações, estão obrigadas ao Lucro Real empresas com receita total, no ano-calendário anterior, seja superior ao limite de R$ 48 milhões ou proporcional ao número de meses do período (R$ 4 mil X nº de meses), quando inferior a 12 meses; cujas atividades são de bancos comerciais, de investimento ou que tiverem lucros, rendimentos ou ganhos de capital oriundos do exterior.
O sócio da PricewaterhouseCoopers Fernando Giacobbo explica que, dependendo da sazonalidade do negócio, ao escolher o recolhimento pelo Lucro Real trimestral ou o Presumido o desembolso ocorrerá apenas em abril do ano seguinte. Isso ocorre no agronegócio, que depende da safra e de sua comercialização.
Quando a colheita é apenas no segundo semestre, o produtor tem receita pequena e elevados custos no início do ano. Sendo assim, o melhor é optar pelo Lucro Real anual, pois os prejuízos do início do período são compensados com os lucros do segundo semestre.
Giacobbo diz que, para as companhias com margem de lucro não tão alta, é mais vantajoso optar pelo Lucro Real, porém o sistema exige mais controle. A apuração deve ser feita mensalmente para quem escolhe o anual. No Lucro Presumido, a apuração é trimestral; dependendo do tipo de atividade a alíquota é de 8% a 32%.
Em função da crise, os sócios da DSR Auditores Roberto José Fidryszewski e Valter Dall'Agnol sugerem que os empresários façam o planejamento no Lucro Real, evitando sobressaltos. "Quem optar para pagar pelo Presumido calculará o lucro pelo faturamento. Como saber se terá resultados no próximo ano", questiona Dall'Agnol. A escolha pelo Lucro Real auxiliará os empresários a se preservarem em um período que será difícil devido à redução da rentabilidade nos negócios.
Nova legislação e Sped causam impacto
A nova legislação contábil, introduzida pela Lei 11.638, traz alterações e a convergência às práticas internacionais, por meio da International Financial Reporting Standard (IFRS). Segundo o sócio da PricewaterhouseCoopers Fernando Giacobbo, a norma não deveria trazer reflexos tributários, mas há dois aspectos que causam impactos: os percentuais da depreciação dos bens do ativo permanente e o ajuste a valor presente de itens como clientes, contas a receber e a pagar.
"Há uma incerteza e grande discussão com relação a outros aspectos da legislação tributária vigente e à parte contábil. Questões como ágio e sua correspondente amortização na aquisição de investimentos, entre outras, devem ser analisadas com cuidado", diz. Segundo o tributarista, o tema requer um melhor entendimento por parte da administração de como os balanços de dezembro de 2008 deverão refletir a mudança.
No caso do Sped, ao contrário do que muitos contribuintes esperam, ele envolverá mais do que apenas a informatização dos sistemas das empresas. Ele requer uma mudança em todos os fluxos de informações, com processos para captura e manutenção dos dados. O Sped exigirá uma administração tributária e contábil de forma mais tempestiva. Com o sistema, o Fisco terá mensalmente acesso a todas as movimentações feitas pelas empresas, sejam compras, vendas e outras situações.
Com um tempo de preparo para o envio desses dados menor do que o existente hoje e um nível de detalhamento maior, a possibilidade de retificações e correções posteriores será mais restrita. "Erros resultarão em questionamento do que gerou a retificação", diz Giacobbo. Segundo ele, poucas são as empresas sensibilizadas quanto à real dimensão do Sped e ao impacto que ele trará aos negócios.
O novo sistema, que entrará em vigor a partir de 2009, possibilitará à Receita Federal descobrir os planejamentos tributários realizados equivocadamente. "Para o sonegador, essa será uma tarefa mais difícil ainda assim que a fiscalização puder acessar as informações referentes ao ICMS e os dados da Previdência Social", diz Roberto José Fidryszewski, sócio da DRS Auditores. Dessa forma, será necessário aplicar o planejamento não no sentido de pagar menos, mas sim a quantia correta pelos tributos e dentro da margem legal. "Quem paga em determinado momento valor a menor para a Receita pode vir a ter que desembolsar mais futuramente, o que também não será vantajoso", argumenta.
Contabilidade é auxiliar na tomada de decisões
A "nuvem negra" sobre a economia mundial atingirá a todos em 2009, mas alguns sentirão mais os reflexos, dependendo do ramo de atividades. A opinião é dos sócios da DRS Auditores, Roberto José Fidryszewski e Valter Dall'Agnol. Segundo eles, a crise não deixará de atingir o Brasil, porém essa é uma oportunidade para aprender e acertar os ponteiros. As empresas capitalizadas e que não dependem de bancos poderão se sair bem, argumenta Fidryszewski.
Já Dall'Agnol acredita que a economia real sofrerá no sentido em que o consumo pode ser reduzido, embora o País tenha a vantagem de que grande parte das importações realizadas foram para a melhoria de parques industriais. "Quem sentirá mais o baque serão aqueles focados em exportação, exceto os do setor de alimentação, que deve continuar a crescer", diz. Segundo o auditor, os maiores prejudicados com a retenção nos mercados serão aqueles que especularam e fizeram operação de hedge acima da sua exportação. Ele cita como exemplo o setor coureiro-calçadista, onde alguns empresários apostaram na cotação do dólar abaixo de R$ 1,75. Com a alta da moeda, a diferença existente agora será repassada nos preços dos produtos comercializados junto aos clientes.
"A dúvida é saber agora o que fazer para crescer em um mercado recessivo. É preciso buscar alternativas", diz. Ele aconselha os empresários a se planejarem, dominando todos os pontos do negócio que desenvolvem, sabendo o que ocorre quando se opta por um sistema tributário ou outro ou por fazer as compras no mercado interno ou externo. O planejamento deve ocorrer antes, prevendo atitudes em caso de crises. "Durante muito tempo a contabilidade foi feita meramente para o Fisco, hoje é um meio para o empresário entender o que acontece e um acompanhamento a sua gestão."
Segundo o tributarista da Veirano Advogados André Gomes, outra forma de recuperar possíveis perdas é a busca de contenciosos tributários, que garantem ganhos sobre questões controversas. A medida registrou um crescimento nos últimos anos. É o caso da CSLL sobre as receitas decorrentes das operações de exportações. Várias empresas estão questionando o seu pagamento, obtendo decisões favoráveis na Justiça para suspender a contribuição. "É fundamental conhecer as operações e os objetivos empresariais, o que é importante para determinado negócio, e conhecer a legislação. Combinando esses elementos e investindo tempo, há grande possibilidade de melhorar a situação", diz.